18/10/2018

Alunos e professores debatem regulação do consumo de álcool na FCM/Santa Casa Especialistas da USP e da Unifesp participaram da discussão e compartilharam suas experiências

Especialistas em álcool e drogas da faculdade da Santa Casa, da USP e da Unifesp participaram do debate. Clique na imagem para ver o álbum de fotos do evento.

Nesta terça-feira, 17, a Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Santa Casa de São Paulo promoveu o primeiro encontro oficial com os seus estudantes para debater o consumo de álcool na instituição. Com o nome “Discussão do Modelo de Regulação do Uso de Bebidas Alcoólicas na FCM/Santa Casa”, o evento trouxe professores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) para apresentarem as soluções encontradas por suas instituições.

A reunião foi aberta pelo diretor da FCM/Santa Casa, Prof. Dr. Paulo Carrara de Castro, que solicitou a organização do encontro ao Prof. Dr. Guilherme Messas, docente e coordenador do Programa de Duplo Diagnóstico em Álcool e Outras Drogas da instituição. “Espero que esta seja a primeira de várias discussões que, além de transmitir informações sobre o tema, auxiliem alunos e diretoria da faculdade a encontrarem mecanismos de regulação do uso de bebidas alcóolicas na instituição. Regulamentar é fazer um acordo, cuja base é evitar as consequências danosas do álcool no ambiente acadêmico”, ressaltou Carrara.

Participaram do evento o Prof. Dr. Ricardo Abrantes do Amaral, professor colaborador do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina (FM) da USP e coordenador de ensino do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas (GREA) do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas (HC) da FMUSP; e o Prof. Dr. Thiago Marques Fidalgo, professor da Disciplina de Álcool e Drogas e Políticas Públicas do Departamento de Psiquiatria da Unifesp e  coordenador de assistência do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (PROAD) da universidade.  A acadêmica Flavia Yarshell, presidente do CAMA (Centro Acadêmico Manoel de Abreu) da FCM/Santa, integrou o debate representando os alunos.

Consequências do uso nocivo de álcool no mundo

A discussão teve início com uma apresentação do professor Messas, da FCM/Santa Casa, sobre a necessidade de abordar o consumo de bebidas alcóolicas em faculdades e universidades públicas e particulares. Para mostrar a urgência do tema, o psiquiatra destacou dados do Relatório Global sobre Álcool e Saúde 2018, divulgado em setembro pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

A agência revela que o uso nocivo do álcool é um dos fatores de risco de maior impacto para a morbidade, mortalidade e incapacidades em todo o mundo. “Três fatores colocam o uso de álcool nessa posição: ele causa dependência, eleva o risco de diversos tumores e – o aspecto mais relevante – provoca intoxicação aguda que altera a consciência, ocasionando acidentes e atos de violência”, explicou Messas.

Para a OMS, a prevenção e redução do uso nocivo do álcool devem ser tratadas como prioridade. Relacionado a três milhões de mortes em 2016 – o equivalente a quase 5,3% de todos os óbitos no mundo, o consumo da substância mata mais pessoas do que a aids, a tuberculose e a violência combinadas. “Precisamos nos posicionar, como médicos e como instituição, sobre o problema. É necessário um regime de regulação balizado e que colabore com o que é preconizado pela OMS”, defendeu o professor.  Messas salientou que, de acordo com a OMS, o controle da disponibilidade de álcool é uma das estratégias cientificamente mais eficazes para a redução de danos.

Qualidade de vida do estudante é prioridade

Com 25 anos de experiência na área de álcool e drogas, o Prof. Dr. Ricardo Abrantes do Amaral atuou em diversas unidades da USP em programas de prevenção e tratamento de alunos e funcionários.  Ele contou que, em seus atendimentos, muitas vezes, a questão do álcool não era a mais significativa. “Discutir substâncias é menos importante que discutir a qualidade de vida do estudante de medicina e futuro médico. Esta é a questão principal. O curso cobra muito de nós, com plantões, internato, provas… sofremos uma pressão muito grande. E o que sentimos, como agimos e nos relacionamos reflete no paciente e em outras pessoas”.

Amaral sugeriu aos graduandos da FCM/Santa Casa que adotem uma postura propositiva e não radical em relação à questão. “Minha sugestão é que vocês montem uma comissão para conhecer o que vem sendo feito na USP. E que listem suas pautas, incluindo o consumo de álcool, para pensar junto com a faculdade”.

A elaboração de uma política universitária

O Prof. Dr. Thiago Marques Fidalgo detalhou o processo de elaboração da política sobre álcool e drogas da Unifesp, que foi publicada este ano. “Iniciamos como vocês, com eventos envolvendo alunos e universidade e buscando parcerias com outras instituições que já possuíam uma política implementada”, lembrou.

O psiquiatra salientou que, de acordo com a legislação federal, espaços públicos não podem comportar o consumo de álcool, o que eliminou o seu uso dentro do campus. As festas externas, organizadas pela atlética da Unifesp, continuaram permitindo o consumo, mas passaram a adotar medidas de redução da disponibilidade da substância, como aumento do preço das bebidas, intervalos no funcionamento dos bares e distribuição gratuita de água e alimentos com alto teor glicêmico.

Os organizadores das festas precisaram também divulgar campanhas de prevenção e atuar, após o evento, na identificação e orientação de alunos que apresentaram problemas com álcool. “Com estas medidas, a nossa atlética, que atrelava bastante o uso de álcool à socialização, precisou se reinventar. Embora tenha sido trabalhoso, o processo foi muito criativo. Resistentes no início, hoje os alunos têm a impressão de que as mudanças foram benéficas”, afirmou Fidalgo.

Durante a reunião, os graduandos apresentaram suas demandas e pontos de vista aos professores, elogiando a iniciativa e solicitando mais eventos como este. “É muito bom entender como outras faculdades de medicina estão lidando com o assunto e perceber que não estamos sozinhos em nossas reivindicações e desafios”, disse Flavia Yarshell, presidente do CAMA.

Para saber mais:

Relatório Global sobre Álcool e Saúde 2018

Política sobre Álcool e outras Drogas na Universidade Federal de São Paulo