8/5/2019
Os Acidentes e Doenças do Trabalho podem ser nossa primeira referência ao pensar em custo da saúde dos trabalhadores. Mas se ampliarmos nossa visão podemos assentir que todas as doenças têm alguma relação com o trabalho, ora ocasionadas ou agravadas por ele e em outras ocasiões gerando alguma repercussão para o mesmo, como o absenteísmo ou até mesmo o presenteísmo. Consequentemente, todas as doenças oneram os custos relacionados à saúde dos trabalhadores.
Primeiramente as Doenças Relacionadas ao Trabalho vem mudando o seu perfil no Brasil, devido a mudança da economia dos setores primários e secundários para o terciário. Desta maneira, das “tradicionais” Doenças Relacionadas ao Trabalho (intoxicação por metais, silicose, perda auditiva) passamos para o aumento da importância dos transtornos mentais relacionados ao trabalho. No ano de 2018 houve um aumento de 12% de benefícios concedidas pelo INSS por transtornos mentais adquiridos no trabalho em relação a 2017. Muitos fatores contribuíram para este perfil de adoecimento, como longos períodos de deslocamento, jornadas extensas, falta de tempo para cuidar da saúde, além da pressão por resultado.
Além de repensar esta cultura de controle das empresas, estendendo a concepção do gasto com a saúde, as empresas deverão também considerar mudanças nas práticas de qualidade de vida, que poderão prevenir, por exemplo, diabetes, uma Doença Crônica Não Transmissível (DCNT). O foco deverá ser tanto o comportamento do indivíduo, como a organização do trabalho, esta, visando uma melhor comunicação, maior transparência nas ações, além da percepção de estabilidade no trabalho. Ou seja, esta abordagem mais global deverá abordar indicadores que foquem não só em sinistros e afastamentos, mas também em aspectos relacionados a hábitos de vida, lazer e estabilidade financeira.
Os gastos com saúde estão crescendo num ritmo mais acelerado que o restante da economia global, representando 10% do produto interno bruto (PIB) mundial. No Brasil, atualmente, o gasto total em Saúde é de cerca de 8% do PIB; 4,4% do PIB é de gastos privados (55% do total) e 3,8% PIB de gastos públicos (45% do total).
A assistência à saúde no Brasil envolve o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema de Saúde Suplementar, como citado anteriormente ambos os casos tiveram aumento do custo, estimado, em média, 10,9% ao ano entre 2016-2018. O aumento do custo com a saúde envolve o envelhecimento da população, custo com internações e impacto do uso de novas tecnologias, não podendo deixar de citar a dedução de gastos de saúde no Imposto de Renda. As novas tecnologias podem abranger desde exames genéticos, aperfeiçoamento das órteses e próteses, e até mesmo os quimioterápicos ministrados por via oral, a imunoterapia, as cirurgias com auxílio de robôs, implante de stents.
Considerando que aproximadamente 67% dos beneficiários de planos de saúde privados no Brasil têm planos coletivos empresarias, resulta na elevação dos gastos com a saúde dos trabalhadores das empresas. Desta maneira é essencial que haja investimento na melhoria da saúde, caso esta gestão sustentável e populacional de saúde não seja incentivada poderá repercutir nas empresas não conseguindo mais ofertar este benefício aos trabalhadores.
Além de implementar alterações nas configurações dos planos, as empresas devem se esforçar para que consigam identificar e encaminhar de forma proativa doenças complexas e onerosas.
A oportunidade de analisar os dados de forma agregada, considerando dados de prontuários eletrônicos, sociodemográficos e laboratoriais, além dos dados das contas médicas pode gerar uma melhor qualidade e eficiência dos cuidados com a saúde.
Estas necessidades estão em concordância com as definições da Organização Mundial de Saúde (OMS) na qual, dentre suas 10 prioridades, inclui, Doenças Crônicas Não Transmissíveis (diabetes, câncer e doenças cardiovasculares), Pandemia de Gripe, Atenção Primaria à Saúde e Relutância em Vacinar. Todas estas ações podem estar integradas com o planejamento da Saúde do Trabalhador promovido pelo Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT) gerenciado pelo Médico do Trabalho, exercendo desta maneira o papel de Gestor da Saúde, uma das competências desta Especialidade Médica.
A atenção primária à saúde é o atendimento inicial, cujo principal objetivo é a prevenção de doenças, diagnóstico precoce, tratamento de agravos simples e o direcionamento de casos graves para outros níveis de complexidade. Esta Atenção pode ser incluída nos próprios Serviços Médicos das Empresas, existem diversos Modelos para esta implantação. Um deles, é realizá-lo juntamente com o exame médico periódico, ou mesmo implantar um Serviço específico de Assistência à Saúde. Por meio de ações integradas e estratégicas, este Modelo é considerado mais eficiente que o de livre escolha adotado majoritariamente pelas operadoras, o qual é mais caro e ineficiente. Segundo as empresas do setor privado, o foco no atendimento primário reduz entre 20% e 30% as despesas.
A solução é investir em programas de Gestão de Saúde, em vez de, somente, custear tratamentos. Nesse campo, a Atenção Primária à Saúde é uma importante aliada para diminuir custos com planos de saúde. Uma vez que são estimulados hábitos saudáveis com consequente redução da incidência de doenças, além de promover tratamento precoce e menos invasivo.
Concluindo, um programa moderno de gestão deve ter foco na Saúde em vez da doença!
REFERÊNCIAS
CORDILHA, Ana Carolina; LAVINAS, Lena. Transformações dos sistemas de saúde na era da financeirização. Lições da França e do Brasil. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 23, n. 7, p. 2147-2158, Julho 2018 .
SALDIVA, Paulo Hilário Nascimento; VERAS, Mariana. Gastos públicos com saúde: breve histórico, situação atual e perspectivas futuras. Estud. av., São Paulo , v. 32, n. 92, p. 47-61, Abr. 2018 .
Secretaria do Tesouro Nacional. Aspectos Fiscais da Saúde no Brasil. Out. 2018.
ANAMT. Competências essenciais requeridas para o exercício da medicina do trabalho: revisão 2018 / [equipe de trabalho] Elizabeth Costa Dias [coordenadora]…[et al.]. – 3. ed. – São Paulo, SP: ANAMT – Associação Nacional de Medicina do Trabalho, 2018.
Publicado originalmente no Boletim FIESP/CIESP – Edição 55/abril/2019
* Flávia Souza e Silva de Almeida é presidente da Associação Paulista de Medicina do Trabalho (APMT), professora Faculdade de Ciências Médicas de São Paulo e médica do Trabalho do SESI/Vila Leopoldina.